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Sangue por Sangue

Ambos temos o sangue quente, para o bem e para o mal. Tanto aquece a alma como pinha que arde na lareira, quanto a reduz a cinzas como fogo que percorre a floresta. Não quero chocar contigo, como pedra riscada em pedro, fazendo faísca. Embora, a idéia me faça estremecer, sentir uma espécie de vibração parecida com aquela de entrada de mensagem no telemóvel. De ti já senti mais vezes o sangue que aquece e, ao de leve, o que chamusca (como vento que não despenteia). Se estivesse no fim da vida, “ateava” o sangue à primeira árvore, mas como não estou, deixo-o a fervilhar dos pés à cabeça. Proponho então “sangue por sangue”. Um copo para cada um, com vinho tinto até meio. Um exercício como o tango, eu comando os goles de vinho. Como não desejo uma transfusão do teu sangue, bebo como se o copo fosse um balão de soro, gota a gota. Só posso molhar os lábios mais do que isso, começo a ver azinheiras à minha volta. Tu sorris e bebes pequenas quantidades. Invejo-te e para também poder sentir o vinho a escorrer pela garganta, troco os copos. Ao primeiro trago sinto o risco de ser a área de mato. Perante o perigo, esvazio por mim abaixo a garrafa de vinho, faz-me parecer menos mal empregue. Tu reages com serenidade e assim começo a arrefecer. Peço a Baco que me dê tréguas e a Zeus que mande chuva. Feita a minha vontade, seguras-me delicadamente na mão e levas-me para debaixo da azinheira; encostados ao tronco, lado a lado, adormecemos a contar as gotas da chuva, que são sangue, vinho e pecado.

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