Quando o mar me invade, mais forte do que o estrondo que provoca na rocha, distrai-me. Leva-me para ondas nunca antes navegadas. Traz-me o silêncio e os seus aforismos. Não sei se quero ir ou ficar. Tanto faz dormir ou sonhar. Ele está no meu despertar, no meu poente, na tarde que me encosto ao mar. A majestosa gaivota passeia no muro mesmo à minha frente. Provoca-me. Põe a lua em leão. O coração foge-me para a maresia. És da família do mar. Do mar da Índia. Do meu mar… ondas se cruzam e cruzam e voltam a cruzar. Onde intercedo eu ? Talvez já tenha intercedido num segundo corajoso. Mas o meu relógio não é à prova de água. Nem eu sou à tua prova. Eu morro e renasço à sétima onda. A espuma acalenta o meu desejo. Bem podias ser um ouriço do mar…@quequeasextafeira
Faz-me companhia um passarinho. Na mesa tosca de carvalho envelhecido, ao meu lado. Por aqui, na serra, há mais pássaros do que árvores. Há um coro permanente do teu timbre medicinal. As árvores já não bailam. Agora apreciam… como te aprecio a ti. As quedas de água, saboreada, têm o teu odor. Caminhos de nêsperas, o teu corpo, Igual! Dois corações, paladar agridoce, ossos de Cinturão. Traz-me o teu olhar salgado, a brisa quente da montanha. -Passarinho, leva-me ao cume da montanha. quequeasextafeira
O verbo que teima em não surgir… Sonho-te com vestes de sair por aí. Eventos e festivais. Encontramo-nos assiduamente. Pisando as pegadas um do outro, alternadamente. Há sempre pessoas em redor. Não nos deixam sequer ouvir o som do vento, do mar, da chuva. Assim, o verbo não tem ocasião. Trago o sabor da desilusão. Do que podia ter sido. Tão apaixonado verbo nos foge. Um verbo que não se defende, morre… autor@quequeasextafeira
Sem te ver. Nem cruzar-me contigo. Anos a fio. Desisti de te procurar. Eras o meu sonho. Em restaurantes e bares. Velas e baladas. Imagina ! Não deixei de sonhar. Fui sonhar para outro lado. Estava de costas. Tinha perdido a memória. A cada passo havia algo. Que me prendia o olhar. Passo a passo. Pé ante pé. Tinha trocado os sonhos. Por este ballet. Autor. quequeasextafeira
Cada um salva o Amor como pode. Crer é a sustentação de todas as formas de Amor. O Amor, às vezes, é tão necessariamente doce e suave que nele te enforcas. Na forca da papoila. Amar uma plenitude de emoções. Dísparos sentimentos fazem o Amor ter sentido. Há uma disgrafia na carne, êxtase sobrenatural. Na alma, um aparo de tinta desenha o Amor cristalizado. Há amores que se sobrepõem. Morrem lentamente sem ressurreição.
Desejo o que vem pela madrugada e me deixa sem abrigo. Creio no Amor da Alvorada. Na magia da água do lago, agora, simetria silenciosa. Amor a rocha paixão. Vai e vem com a maré. Sangra no horizonte a infinita crença dos amantes. Quequeasextafeira
Recebi o teu convite para vires a minha casa. Se o fizesses de véspera não teria acordado. Esperaria na cama por ti… Ainda tinha tempo. Tomei um banho perfumado, de jasmim, e gel espumante, de leite de burra. Cada poro da minha pele foi infetado de perfume. Queria contagiar-te de meu corpo. A fragrância do jasmim agravava a minha ânsia. Os meus seios palpitavam. O vestido, da cor da Lagoa do Fogo, só tinha uma alça para se enfiar no pescoço. Fiquei com os ombros e o colo a nu. O decote fechava nas pregas dos seios. Pus um pequeno brinco, de prata, na orelha esquerda. Descalça e sem maquiagem. Estava pronta para os minutos que me desses de atenção. Podias ser areia, rocha ou pedro, sentia-me atraída por mim. Ouvi o som e não hesitei. Não se desperdiçam segundos de ti. Ao ver-te, ao ouvir-te, coloquei uns fios com missangas nos tornozelos. Fiz a dança do ventre para que te perdesses na leitura dos meus movimentos.
Os braços em movimentos de serpente, serpenteiam os teus cabelos. Já é outono no teu cabelo. Senti o tempo que passou ao tentar fazer-te um caracol com um fio de cabelo. Formidável…como a vida vai passando e caíndo entre os dedos da mão. Esta lembrança fez-me rasgar a cortina de seda transparente. Ousadamente envolvi-te numa espécie de teia. Entrei com beijos de alpinista enquanto fazias apneia. Quando nos encontrámos, olhos nos olhos, não resististe aos meus lábios, muito bem delineados e sem batom. E… Deixas cair a pauta e beijas-me sem Dó. Cada movimento das nossas bocas já não é preliminar. É amor que se faz. Nos lábios sentimos os orgasmos um do outro. São beijos do século passado. Fazes crer que o poder é da flor do jasmim. Concordo com a tua mentira. Quando vou olhar para ti fazes “Esc”. Assim, trepa a flor de jasmim em tempos de pandemia. quequeasextafeira
Cem beijos me apanhas Apenas o cigarro levo à boca Tenho pressa da nossa vida boêmia da teimosia dos beijos em Paris Os teus lábios agora a cadeado deixam de ser fantasia
Beijar de modo errante como dois vagabundos Enamorados impetuosos. Acabe o jejum cem beijos
A minha casa ficava numa pequena praça. Pequenos prédios já muito antigos cor de café com leite e verde azeitona, rodeavam a praça. Havia um pequeno café, um lugar onde se vendia fruta, legumes e alguns produtos de mercearia, uma farmácia. Quatro árvores de folha caduca, um bebedouro e quatro bancos de jardim com a tinta muito gasta. No inverno, praticamente, só se viam pombos, na praça. Só era simpática, na primavera, com as árvores cheias de pequenas folhinhas e o movimento das crianças animadas, felizes, por já poderem ir brincar para a praça. Era, portanto; escura, feia, fria e “triste” durante quase todo o ano. Não fosse o quiosque, eu não saberia distinguir o feio do belo, a tristeza da felicidade. O quiosque era todo cinzento, com um aspecto muito velho (estragado pelos anos). Mas era de uma beleza “adormecida”, incomparável.
O senhor Augusto, dono do quiosque, era muito sisudo e antipático. Vendia tabaco, jornais, lotarias, pilhas, pastilhas e rebuçados. Ninguém se perdia a conversar junto ao quiosque. Não era nada convidativo. Os habitantes referiam-se a ele como “a barraca”. Não conhecia nada na cidade mais belo do que o que o quiosque da minha praça. Se eu pudesse levava-o para casa. O telhado era formado por triângulos e pequenos adornos fazendo lembrar a arquitetura oriental. Ou aquelas belas gaiolas do Oriente. As pequenas janelas de vidro estavam muito sujas e com pequenas rachas, das fisgadas dos miúdos.O Sol batia nelas refletindo uma luz “desmaiada”. As portadas de madeira tinham a tinta a estalar e chiavam, ao abrir e fechar. Eu tomava as dores do quiosque. Preenchia o meu imaginário e o sonho de conhecer o Oriente. De descobrir o amor pela mão de um homem oriental. Daqueles de olhos claros, morenos e cabelo encaracolado nas pontas. Um dia, tive de sair da praça e fui viver para longe. Durante duas décadas, não quis lá voltar. Tinha receio que o quiosque tivesse desaparecido. Era o mais provável, com a desenfreada urbanização e consequente desaparecimento de quiosques, cabines telefónicas, marcos do correio… Num momento da vida mais difícil, resolvi ir à praça. Não tinha nada a perder. Nem fui ao Oriente nem descobri o amor. Aproximo-me da praça com o coração a bater, como adolescente que vai ao cinema com o primeiro namorado. Vislumbro um “Império”. O quiosque era a atração da praça, inclusive para os turistas. Todo restaurado e pintado de cor de cereja. As janelinhas pareciam de cristal. As portadas envernizadas acentuavam o brilho que durante anos só eu via. Tornou-se o altar da praça.
Encostei-me à árvore ( que ainda lá estava) e fiquei a observar o “meu” quiosque. Alguns turistas tiravam fotografias, fascinados, siderados. No meio deles, vejo um homem muito parecido com o tal homem oriental. Percebi que se desejarmos muito uma coisa, mesmo durante algumas décadas, a magia acontece. Quequesextafeira
Não sei quase nada a teu respeito. Sempre te vi à distância e esporadicamente. Assumo a minha atração, desejo, vontade, de te conhecer. És meu delírio há dezenas de anos. Agora que me chamas assim repentinamente, sinto-me planeta à volta do Sol. Acordar na minha cama e à noite dormir na tua ainda não parece verdade. Vou a voar, mas chego uma hora mais tarde. Espera serenamente para me acolheres nos teus braços e me dares um beijo húmido. Estas borboletas, no meu estômago, bailam com mais intensidade. A sensação que tenho é que me estão a desafiar para que me entregue logo a ti ao passar pelas nuvens. Tenho a convicção de que ainda és mais sedutora do que aquilo que imagino. Tens semblante de Giacomo Casanova e som perfumado de Vivaldi. Se no teu leito renascer, amar e morrer de amores, fico tua refém.Prisioneira afortunada serei.No domingo dir-te-ei: – Buona sera, Venetia.