poesia

Dream…Dream…Dream

O sonho é Meu. Fantasia ou toxicidade…o sonho é Meu. Nas asas da primavera, o Meu sonho, vai para onde eu quiser. Não sonhas, o Meu sonho, na tua direcção… Leva-me, soprado pelo vento quente da montanha. O Meu sonho, espelha-se no lago, espelha-se no teu espelho, espelha-se em mim. Mas, o sonho é só Meu. O homem que reconheço e o que não reconheço no sonho, é Meu. O incendiário, do Meu sonho, o fogo não apaga. O homem não foge, adormeço. A ponte rui…seguro-me nas penas, do Meu sonho. Egoísta; narcisista; possessivo; libidinoso; misterioso; complexo; límpido…o sonho é Meu. @quequesasextafeira

Enamoramento

Ossos de Cinturão

Faz-me companhia um passarinho. Na mesa tosca de carvalho envelhecido, ao meu lado. Por aqui, na serra, há mais pássaros do que árvores. Há um coro permanente do teu timbre medicinal. As árvores já não bailam. Agora apreciam… como te aprecio a ti. As quedas de água, saboreada, têm o teu odor. Caminhos de nêsperas, o teu corpo, Igual! Dois corações, paladar agridoce, ossos de Cinturão. Traz-me o teu olhar salgado, a brisa quente da montanha. -Passarinho, leva-me ao cume da montanha. quequeasextafeira

Passarinho, leva-me ao cume da montanha.

Amantes, Sem categoria

Lembranças de corpos usados.

Uma pequena sala. Um biombo de bambu. Uma cesta. Uma lata com variadas folhas de chá. Um pedaço de pano de seda púrpura. O cheiro das folhas de chá era mais intenso do que o cheiro a sexo. Velhas almas… Sem rum. Sem ligas. Sem espelho. Lembrava a noite da consoada. Pouca carne e muita canela. Nostalgia. Lembranças de corpos usados; de cabazes de prazer. Mais sémen do que orgasmos.

O biombo. Belo. Perfeito. Virgem. Adornava a inquietude que ali se sentia. Via-se nas ripas a palma da mão do artesão. A linha pujante da vida. O coração na cabeça. Quantas vezes perdida.

A cesta aquecia a sala. Convidava a ficar. Uma cesta tem pão e vinho. Logo, nada nos falta. Como na ceia de Cristo. Parecia Natal. Era Natal. Agora é sempre Natal. Não são precisos motivos para celebrar; beber; oferecer; rir; chorar; amar. A cesta estava ali, há muitos anos. Como o cinzeiro. Como as paredes. Autor quequeasextafeira

Mais semen do que orgasmos.
#destino, #flores

Pétala

Vezes inenarráveis. Corri atrás de famílias botânicas. No campo. Deitava-me ao lado das margaridas, do malmequer-do-campo, do malmequer-amarelo. Colocava-as nos cabelos. Junto à pele ( pescoço, colo, seios, pés). Cheirava. Comi algumas. Levava para casa. Colocava às escondidas no meio das folhas dos livros. A minha pequena biblioteca era o meu diário. Fazia pulseiras para o pé. Carícias deliciosas me proporcionava o meu Malmequer.

Um dia. O campo tornou-se cimento. A biblioteca arrombada. Eu, desfolhada… Senti-me num campo de concentração. Confiei. Na margarida, no malmequer-amarelo, no malmequer-do-campo. Não fui a tempo de perguntar aos malmequeres. Se o meu malmequer “bem me quer” ou “mal me quer”.

Dei-me à praia. Corri atrás das ondas. Vi nascer o pôr do sol. Das conchas nada fiz. Nem a areia levava para casa.

Caiu o outono sob o mar. Vinha em modo de depressão. Tinha pressa. Vesti o casaco esquecido numa qualquer gaveta. Da comoda gasta da casa do campo. Era o casaco que levava para ver os malmequeres. Apertei o cinto. Meti as mãos nos bolsos. Senti uma tira achatada. Lembrei-me do cheiro, da textura, da cor. Um arrepio sentido. Era ele. Uma parte dele. Tinha a certeza. Abri a mão. A pétala do meu Malmequer preferido. Uma pétala não satisfaz uma abelha. Uma pétala não forma uma flor. Uma pétala não faz um jardim. Uma pétala não cria expetativas. MAS. Uma pétala, a mim, traz-me muito feliz. Autor. quequeasextafeira

Obrigada pela pétala.

#destino

Do medo o desejo

Maria Manuel chegou atrasada à idade adulta. Quinze minutos depois das primeiras pancadas de Moliere. Sentou-se na plateia. O camarote era para um público encarcerado. Exibicionista, ostentativo, pretensioso. A escuridão da sala contrastava com os corpos esguios. Nus. Pintados de cores chamativas. Tremeu. Arrependeu-se de não ter a garrafa. A água afastava o medo. Temeu. Temeu ser crude no mar. Num impulso, subiu para o palco. O ator principal levanta as sobrancelhas e acena. Aquele “sim”… Sentiu-o como encorajamento para o suicídio. Esbofeteou o público. Perto dele, via-se gueixa. Do camarote ouviam-se risos de regozijo. Fúteis. Incultas. O público feminino queria-a esfaqueada. Os homens contraíam-se cobardemente. O ator principal assiste como se não bastasse. Suplica pela garrafa. Ele ignora-a. A água que tanto necessitava…estava a afogá-la. Desafia-o. Pinta o corpo. Fica demasiadamente colorido. Com cores para todos os paladares. Pronto. Fez do medo o desejo dos outros. Entornou todos os vinhos do ato da Severa. Deu gargalhadas das atuações em bordéis, motéis. A plateia aplaude a moral enxovalhada dos burgueses. O ator principal observa. A sua face é um misto de satisfação e expetativa. Maria Manuel aproveita a deixa. Pede-lhe mais pedra. Recusa. Não o irá derrotar. Nem pedra. Nem pão. Nem água. Diz-lhe sem dó. Sem agosto, sem garrafa, sem pedra! Bruxo. Cruel. Louco. Grita-lhe em surdina. O público reage com exaltação.

Sai de cena. O ator observa a sua descida. Guarda a garrafa de água no seu camarim. Maria Manuel tinha-a largado na bilheteria. “The show must go on”. O ator foi ganhando maior visibilidade e alcançou os mais prestigiados papéis. Uma qualquer noite, Maria Manuel volta ao teatro. Ouve as pancadas de Moliere. Assiste de pé à estreia. A água muleta. A pedra álibi. Agosto mágico. Divide a glória com o ator principal. Ele no palco. Júpiter. Ela de pé. Hera. Autor quequeasextafeira

The show must go on.

Amantes

O boémio incofesso

O pêndulo alcança o equilíbrio. O corpo inicia um movimento em sentido contrário. Como na penúltima noite, enrolei o último charro. À semelhança de uma artista, com sensualidade dancei. Pedro, o rapaz por quem estava apaixonada e com quem me envolvia. Aplaudiu a ideia, mas não apareceu. A vida boemia, suscitava-lhe repulsa, dizia-me. Estranhamente, era visto com frequência em Las Vegas. Uma cidade que mescla exotismo, boemia e bem estar. Pedro, o errante e vagabundo. Assim o conheciam. Enganou-me. Ludibriou-me.

Eu, mulher balzaquiana, amante de Pedro. Não tinha coragem para confrontá-lo. Pois, receava um “embate” violento. Na verdade, que perdesse o desejo sexual. Uma aflição. Mulher condicionada, sem sim, sem não.

Tomei uma atitude. Comprei duas passagens para o Carnaval de Veneza. O tema era “Il Gioco, l’Amore e la Folia”. Pensei comigo mesma: Pedro não teria coragem de negar este presente. Determinada, e com uma dedicação ardente, observava-o a abrir o envelope. Pedro fez um sorriso meigo e disse: – Querida não posso. Infelizmente, não. Pareceu-me ouvir uma música fúnebre, uma dança de defuntos, um desfile sangrento. Implicitamente havia um sim na sua resposta. O rosto denunciava o verdadeiro desejo de Pedro. O boémio incofesso. Pelo menos para mim. O “Não” era perentório, como se me quissese castigar. Percebi o seu poder soberano. Um direito exclusivo de si mesmo. quequeasextafeira

Mulher, sem sim, sem não.

#paz, Amantes

Tropeçar e Amar

Os nossos passos podem fazer-nos tropeçar. Um passo nunca pode ser maior do que a perna. Fica a sensação que todo o caminho percorrido foi em vão, mas nunca é. Não é preciso dar um passo atrás, basta permaneceres um tempo no mesmo sítio. Não parece verbo, mas é. A vida não é um mapa. Não escolhemos onde queremos parar. Contudo, decidimos o caminho a tomar. Parar e retomar é sempre mais difícil. Parece que o sonho mais belo não volta mais. Não sabes responder ao que fazes ali. Na verdade, não precisas de perguntas. Sabes que ali é onde deves ficar. Há momentos, em que só nós podemos fazer algo por nós, mais ninguém. Não adianta querer saber o que é o Amor se não o reconheceres dentro de ti. Esta descoberta dói, fere, magoa. Nunca sara. O Amor é a ferida mais bonita que te podem oferecer. Agora, sim, continua a caminhar. quequeasextafeira

Parar para Amar

Amantes, Enamoramento

Salvé o Amor

Cada um salva o Amor como pode. Crer é a sustentação de todas as formas de Amor. O Amor, às vezes, é tão necessariamente doce e suave que nele te enforcas. Na forca da papoila. Amar uma plenitude de emoções. Dísparos sentimentos fazem o Amor ter sentido. Há uma disgrafia na carne, êxtase sobrenatural. Na alma, um aparo de tinta desenha o Amor cristalizado. Há amores que se sobrepõem. Morrem lentamente sem ressurreição.

Desejo o que vem pela madrugada e me deixa sem abrigo. Creio no Amor da Alvorada. Na magia da água do lago, agora, simetria silenciosa. Amor a rocha paixão. Vai e vem com a maré. Sangra no horizonte a infinita crença dos amantes. Quequeasextafeira

Sem categoria

Quero olhar para si

Indíca acorda antes do dia amanhecer. O céu de um cinzento muito escuro quase não deixa antever o dia. Explosões de gaivotas anunciam tempestade no mar. Sexta-feira de inverno… Procura-o, e ele pergunta :
– Que aconteceu ?
– Quero olhar para si…
Ele retira os óculos da ponta do nariz. A pinta que lhe davam os óculos, pensou para si. O brilho do seu olhar, enquanto o observava fez também o sol, lento, resplandecer. Disse :    -Estou a olhar para si.
-Recordo-me desse seu olhar – diz ele.
Produz-se uma mudança, subitamente, mais intensa. O homem permanece parado, mas inexplicavelmente, Indíca, de cada vez que o observava, ele parecia sempre diferente. Em cada (não) expressão o charme aumentava. Como os nove graus, do início da manhã, já passaram para treze. Não trocava o inverno pelo verão só para o poder olhar, mesmo que, pontualmente. De repente, ele move-se e diz-lhe:
-Vá, não deixe passar a sexta-feira.

quequeasextafeira

José Mário Branco, Sem categoria

José Mário Branco, o prazer é meu.

Um homem lunar que rasgou a alma através da música. Tendo tido a superioridade intelectual de perceber que a música, para além de uma arma, era o colo da Mãe. Um homem que se sentiu só na tentativa de mudar este retângulo, embora ouvisse bem os aplausos. Era de uma generosidade ímpar. Dava-se aos outros até ao último pingo de suor. Mas ele era um trinco de três trancas. Tinha medo do medo, da felicidade e da morte. Sensível, solidário, combatente, patriota, gentil, inconformado e triste. Parte hoje para longe de nós, com cantos de guitarra e flores vermelhas, como tantas vezes cantou. Quando finalmente podia descobrir o amor, morre precocemente. A travessia valeu a pena porque tocou em todos os corações com quem se cruzou, através da canção ou pessoalmente. Que agora na hora da morte, antes de descer à terra, colha finalmente o amor que semeou, entre os presentes e os ausentes.

José Mário Branco, cheguei no dia da sua partida, para o conhecer. Como vê, a si, a morte não lhe leva a vida. Escusava de ter tido tanto medo. Não, o prazer é todo meu. Vá em paz e que o Amor o acompanhe. Adeus. quequeasextafeira