O verbo que teima em não surgir… Sonho-te com vestes de sair por aí. Eventos e festivais. Encontramo-nos assiduamente. Pisando as pegadas um do outro, alternadamente. Há sempre pessoas em redor. Não nos deixam sequer ouvir o som do vento, do mar, da chuva. Assim, o verbo não tem ocasião. Trago o sabor da desilusão. Do que podia ter sido. Tão apaixonado verbo nos foge. Um verbo que não se defende, morre… autor@quequeasextafeira
Categoria: Amantes
Lembranças de corpos usados.
Uma pequena sala. Um biombo de bambu. Uma cesta. Uma lata com variadas folhas de chá. Um pedaço de pano de seda púrpura. O cheiro das folhas de chá era mais intenso do que o cheiro a sexo. Velhas almas… Sem rum. Sem ligas. Sem espelho. Lembrava a noite da consoada. Pouca carne e muita canela. Nostalgia. Lembranças de corpos usados; de cabazes de prazer. Mais sémen do que orgasmos.
O biombo. Belo. Perfeito. Virgem. Adornava a inquietude que ali se sentia. Via-se nas ripas a palma da mão do artesão. A linha pujante da vida. O coração na cabeça. Quantas vezes perdida.
A cesta aquecia a sala. Convidava a ficar. Uma cesta tem pão e vinho. Logo, nada nos falta. Como na ceia de Cristo. Parecia Natal. Era Natal. Agora é sempre Natal. Não são precisos motivos para celebrar; beber; oferecer; rir; chorar; amar. A cesta estava ali, há muitos anos. Como o cinzeiro. Como as paredes. Autor quequeasextafeira
Hey – Branco ou Tinto ?
– Hey ! Aquela interjeição apanha-me de costas. Era a minha cruz. Leve. De ráfia como a minha sacola. O timbre daquela voz. Há muito. Não a ouvia nascer assim. Sol. A diferença estava na respiração. Apenas. As falas eram sempre em monóxido de carbono. Aqui, respira-se vinha. Fala-se em oxigénio. Podia ter me interpelado com um: “Uva”. Estamos a 165 metros de altitude. Sinto o vulcão ativo. Gota a gota saboreio a expiração. Do H. Do E. Do Y. Descubro o silêncio dos anos cinquenta. “Hey!”. Vindo daquele corpo?! Extraordinariamente extravagante… Bebo vinho pelo xisto. Provocatoria(mente) digo: – Património Imaterial da Humanidade.
-Ahahah. Noviça. Muito bem!
Quer vindimar comigo. Hum… Videiras infindáveis. Escolho um socalco. Branco ou tinto? Não pergunto. O melhor vinho é o que vai para o convento. Segue-me. No lagar pisamos as uvas. O aroma aguça o apetite. Sugiro irmos para a pipa. – Hey ! Autor.quequeasextafeira
Um minuto de Lua
Ofereço-te. Toda ela. Vestida de chama ardente. Nem o arco-íris tem essa cor. É a mais bela de todas. Nunca, ninguém viu essa cor. Sentas-te. Aparece a teus pés. Magnífica. Soberba. Deslumbrante. Sensual. Confiante. És Rei. Aí a tens. Nascida para ser tua. Só. Só tua. As velas brancas dos barquinhos invejam-te. As andorinhas e o cargueiro. Nada te faz desviar o olhar. Ela enche-se. De orgulho. Junto a ti nada a faz minguar. Poderosa. Majestosa. Nunca mais a vais esquecer. É uma relação cósmica. É a tua oportunidade. Tens uns minutos. Aproveita bem este meu presente. Sabes desfrutar. Sabes bem o que vale a vida. Ela vai subindo por ti. Entras em êxtase. Ela sobe mais. Ergues as mãos ao céu. Sem telescópio. Sem bússola. Não sabes. Suicidas-te ou atiras-te da ponte. O luar ilumina-te. És Deus. És Rei. És Tejo. Ela é só um satélite. É a lua. É o minuto que eu gostaria de ser. Ofereço-te a última lua cheia do Verão. Autor. quequeasextafeira
Perdida por uma bala tua
A tua bala é certeira. Não és perfeito, mas és um excelente atirador. Quem prova da tua bala nunca mais esquece o seu sabor. O teu projétil metálico é de ouro. Como o silêncio. És eficaz. Quem te devolve o tiro deixa as balas perdidas. Lanças um pião. Bebes água da fonte. Apanhas um figo. Esperas tranquilamente pelo castigo. Não está à altura do disparo. Pareces o Marquês do alto do seu cavalo. Beijas e dizes adeus.
Uma vez Mulher, não abates. Não atiras contra ti próprio. Contigo usas mísseis. Já nem a morte te faz perder a cabeça. Não és louco. Mas já te deixaste enlouquecer. Sou livre. Livre o suficiente para te desafiar. -Posso puxar o gatilho? -Experimenta. Afirmas. Peço-te dois dias. Entalas a boca no gatilho. O cano apontado a meu peito. Dois dias. Repito. O teu dedo impaciente. -Quero esgotar todos os sonhos. Uma vida assim. Assim, absurda, não volta mais.Perdida por uma bala tua. Perdida por mil. Toma-me no teu cano. E sê justo para ti… quequeasextafeira
O boémio incofesso
O pêndulo alcança o equilíbrio. O corpo inicia um movimento em sentido contrário. Como na penúltima noite, enrolei o último charro. À semelhança de uma artista, com sensualidade dancei. Pedro, o rapaz por quem estava apaixonada e com quem me envolvia. Aplaudiu a ideia, mas não apareceu. A vida boemia, suscitava-lhe repulsa, dizia-me. Estranhamente, era visto com frequência em Las Vegas. Uma cidade que mescla exotismo, boemia e bem estar. Pedro, o errante e vagabundo. Assim o conheciam. Enganou-me. Ludibriou-me.
Eu, mulher balzaquiana, amante de Pedro. Não tinha coragem para confrontá-lo. Pois, receava um “embate” violento. Na verdade, que perdesse o desejo sexual. Uma aflição. Mulher condicionada, sem sim, sem não.
Tomei uma atitude. Comprei duas passagens para o Carnaval de Veneza. O tema era “Il Gioco, l’Amore e la Folia”. Pensei comigo mesma: Pedro não teria coragem de negar este presente. Determinada, e com uma dedicação ardente, observava-o a abrir o envelope. Pedro fez um sorriso meigo e disse: – Querida não posso. Infelizmente, não. Pareceu-me ouvir uma música fúnebre, uma dança de defuntos, um desfile sangrento. Implicitamente havia um sim na sua resposta. O rosto denunciava o verdadeiro desejo de Pedro. O boémio incofesso. Pelo menos para mim. O “Não” era perentório, como se me quissese castigar. Percebi o seu poder soberano. Um direito exclusivo de si mesmo. quequeasextafeira
Uma mentira no seu dedo
Casa-se. Dirige-se para o altar. Invisível aos olhares, leva consigo Madalena. Paixão intensa, profunda, sofredora. Paixão! Durou três estações.
Madalena fora estudar para fora. Conhecera outro jovem e deixou-o. António emagreceu. Perdeu a cor, o ânimo, o vigor.
Estremece ao ouvir a marcha nupcial. Maldito Wagner. A mãe faz-lhe sinal. Vira-se para ver a noiva entrar. Maria do Carmo é a felicidade andante. Sente-se mais seguro. A chave. Tinha três hipóteses. Esquecer. Amar. Desistir. Olha para o pai. Vê um homem orgulhoso. A mãe, por sua vez, depositava toda a Fé no seu casamento.
Ouve em surdina. “Casou-se bem”. Não conheceram Madalena. A sua pétala malmequer. Carmo…”a minha mulher”. Soou mal. Como a música de “Consagração à Nossa Senhora”. Quis o seu nome. Sente-se numa relação de consanguinidade. A aliança. Uma mentira no seu dedo. Uma escritura de comunhão total de bens. Afinal, resumia-se a isso. Conclui António. @quequeasextafeira
A sua pétala malmequer.
Beijo Negro
Trazes-me pela boca
Tecendo em meus lençóis
Bordo o teu nome
No seio umedecido
De um beijo faminto
de sede e jejum
Atrevi-me nos teus lábios
Enamorei-me por eles
Erótico cinto negro
preso à dedicatória
Do beijo que não é meu.
quequeasextafeira
Tropeçar e Amar
Os nossos passos podem fazer-nos tropeçar. Um passo nunca pode ser maior do que a perna. Fica a sensação que todo o caminho percorrido foi em vão, mas nunca é. Não é preciso dar um passo atrás, basta permaneceres um tempo no mesmo sítio. Não parece verbo, mas é. A vida não é um mapa. Não escolhemos onde queremos parar. Contudo, decidimos o caminho a tomar. Parar e retomar é sempre mais difícil. Parece que o sonho mais belo não volta mais. Não sabes responder ao que fazes ali. Na verdade, não precisas de perguntas. Sabes que ali é onde deves ficar. Há momentos, em que só nós podemos fazer algo por nós, mais ninguém. Não adianta querer saber o que é o Amor se não o reconheceres dentro de ti. Esta descoberta dói, fere, magoa. Nunca sara. O Amor é a ferida mais bonita que te podem oferecer. Agora, sim, continua a caminhar. quequeasextafeira
Salvé o Amor
Cada um salva o Amor como pode. Crer é a sustentação de todas as formas de Amor. O Amor, às vezes, é tão necessariamente doce e suave que nele te enforcas. Na forca da papoila. Amar uma plenitude de emoções. Dísparos sentimentos fazem o Amor ter sentido. Há uma disgrafia na carne, êxtase sobrenatural. Na alma, um aparo de tinta desenha o Amor cristalizado. Há amores que se sobrepõem. Morrem lentamente sem ressurreição.
Desejo o que vem pela madrugada e me deixa sem abrigo. Creio no Amor da Alvorada. Na magia da água do lago, agora, simetria silenciosa. Amor a rocha paixão. Vai e vem com a maré. Sangra no horizonte a infinita crença dos amantes. Quequeasextafeira