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O verbo que nos foge

O verbo que teima em não surgir… Sonho-te com vestes de sair por aí. Eventos e festivais. Encontramo-nos assiduamente. Pisando as pegadas um do outro, alternadamente. Há sempre pessoas em redor. Não nos deixam sequer ouvir o som do vento, do mar, da chuva. Assim, o verbo não tem ocasião. Trago o sabor da desilusão. Do que podia ter sido. Tão apaixonado verbo nos foge. Um verbo que não se defende, morre… autor@quequeasextafeira

Amantes, Sem categoria

Lembranças de corpos usados.

Uma pequena sala. Um biombo de bambu. Uma cesta. Uma lata com variadas folhas de chá. Um pedaço de pano de seda púrpura. O cheiro das folhas de chá era mais intenso do que o cheiro a sexo. Velhas almas… Sem rum. Sem ligas. Sem espelho. Lembrava a noite da consoada. Pouca carne e muita canela. Nostalgia. Lembranças de corpos usados; de cabazes de prazer. Mais sémen do que orgasmos.

O biombo. Belo. Perfeito. Virgem. Adornava a inquietude que ali se sentia. Via-se nas ripas a palma da mão do artesão. A linha pujante da vida. O coração na cabeça. Quantas vezes perdida.

A cesta aquecia a sala. Convidava a ficar. Uma cesta tem pão e vinho. Logo, nada nos falta. Como na ceia de Cristo. Parecia Natal. Era Natal. Agora é sempre Natal. Não são precisos motivos para celebrar; beber; oferecer; rir; chorar; amar. A cesta estava ali, há muitos anos. Como o cinzeiro. Como as paredes. Autor quequeasextafeira

Mais semen do que orgasmos.
#destino, Amantes, Sem categoria

Perdida por uma bala tua

A tua bala é certeira. Não és perfeito, mas és um excelente atirador. Quem prova da tua bala nunca mais esquece o seu sabor. O teu projétil metálico é de ouro. Como o silêncio. És eficaz. Quem te devolve o tiro deixa as balas perdidas. Lanças um pião. Bebes água da fonte. Apanhas um figo. Esperas tranquilamente pelo castigo. Não está à altura do disparo. Pareces o Marquês do alto do seu cavalo. Beijas e dizes adeus.

Uma vez Mulher, não abates. Não atiras contra ti próprio. Contigo usas mísseis. Já nem a morte te faz perder a cabeça. Não és louco. Mas já te deixaste enlouquecer. Sou livre. Livre o suficiente para te desafiar. -Posso puxar o gatilho? -Experimenta. Afirmas. Peço-te dois dias. Entalas a boca no gatilho. O cano apontado a meu peito. Dois dias. Repito. O teu dedo impaciente. -Quero esgotar todos os sonhos. Uma vida assim. Assim, absurda, não volta mais.Perdida por uma bala tua. Perdida por mil. Toma-me no teu cano. E sê justo para ti… quequeasextafeira

Toma-me no teu cano. Sê justo para ti.

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Allelujah a 14

Meia noite. Sexta-feira. Sexta- feira, um de Janeiro. Verão. O Sol em agosto. Allelujah ! Brindo. Brindo. Os dois cubos de gelo são passas. Peço um desejo. Noutros tempos, incluia-me. Hoje, o desejo é ímpar. A hortelã do mojito nos lábios salgados.

Peço quinze minutos. A areia desliza pelo meu colo e pela nuca. Arrepios de areia. Há um deserto. Assim, há 25 anos. Janeiro em agosto. Levo figos, canela e chocolate de São Tomé. Aos catorze dias. Allelujah! O sol, a brisa, a espuma do mar. Vens anunciar o outono. Tu, O último pôr do sol. Encarnado. Ferro e Fogo. Ferrero e Pedro. “Cem” Vergonha, o desejo. Allelujah! quequeasextafeira

O último Pôr do Sol…Agosto 14
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Covid 49

Para grandes males, grandes remédios…Do it ! quequeasextafeira

Enamoramento, Sem categoria

O quiosque adormecido

A minha casa ficava numa pequena praça. Pequenos prédios já muito antigos cor de café com leite e verde azeitona, rodeavam a praça. Havia um pequeno café, um lugar onde se vendia fruta, legumes e alguns produtos de mercearia, uma farmácia. Quatro árvores de folha caduca, um bebedouro e quatro bancos de jardim com a tinta muito gasta. No inverno, praticamente, só se viam pombos, na praça. Só era simpática, na primavera, com as árvores cheias de pequenas folhinhas e o movimento das crianças animadas, felizes, por já poderem ir brincar para a praça. Era, portanto; escura, feia, fria e “triste” durante quase todo o ano. Não fosse o quiosque, eu não saberia distinguir o feio do belo, a tristeza da felicidade. O quiosque era todo cinzento, com um aspecto muito velho (estragado pelos anos). Mas era de uma beleza “adormecida”, incomparável.

O senhor Augusto, dono do quiosque, era muito sisudo e antipático. Vendia tabaco, jornais, lotarias, pilhas, pastilhas e rebuçados. Ninguém se perdia a conversar junto ao quiosque. Não era nada convidativo. Os habitantes referiam-se a ele como “a barraca”. Não conhecia nada na cidade mais belo do que o que o quiosque da minha praça. Se eu pudesse levava-o para casa. O telhado era formado por triângulos e pequenos adornos fazendo lembrar a arquitetura oriental. Ou aquelas belas gaiolas do Oriente. As pequenas janelas de vidro estavam muito sujas e com pequenas rachas, das fisgadas dos miúdos.O Sol batia nelas refletindo uma luz “desmaiada”. As portadas de madeira tinham a tinta a estalar e chiavam, ao abrir e fechar. Eu tomava as dores do quiosque. Preenchia o meu imaginário e o sonho de conhecer o Oriente. De descobrir o amor pela mão de um homem oriental. Daqueles de olhos claros, morenos e cabelo encaracolado nas pontas. Um dia, tive de sair da praça e fui viver para longe. Durante duas décadas, não quis lá voltar. Tinha receio que o quiosque tivesse desaparecido. Era o mais provável, com a desenfreada urbanização e consequente desaparecimento de quiosques, cabines telefónicas, marcos do correio… Num momento da vida mais difícil, resolvi ir à praça. Não tinha nada a perder. Nem fui ao Oriente nem descobri o amor. Aproximo-me da praça com o coração a bater, como adolescente que vai ao cinema com o primeiro namorado. Vislumbro um “Império”. O quiosque era a atração da praça, inclusive para os turistas. Todo restaurado e pintado de cor de cereja. As janelinhas pareciam de cristal. As portadas envernizadas acentuavam o brilho que durante anos só eu via. Tornou-se o altar da praça.

Encostei-me à árvore ( que ainda lá estava) e fiquei a observar o “meu” quiosque. Alguns turistas tiravam fotografias, fascinados, siderados. No meio deles, vejo um homem muito parecido com o tal homem oriental. Percebi que se desejarmos muito uma coisa, mesmo durante algumas décadas, a magia acontece. Quequesextafeira

Desejo do Oriente

Enamoramento, Sem categoria

Domingo vou dormir a Veneza

Não sei quase nada a teu respeito. Sempre te vi à distância e esporadicamente. Assumo a minha atração, desejo, vontade, de te conhecer. És meu delírio há dezenas de anos. Agora que me chamas assim repentinamente, sinto-me planeta à volta do Sol. Acordar na minha cama e à noite dormir na tua ainda não parece verdade. Vou a voar, mas chego uma hora mais tarde. Espera serenamente para me acolheres nos teus braços e me dares um beijo húmido. Estas borboletas, no meu estômago, bailam com mais intensidade. A sensação que tenho é que me estão a desafiar para que me entregue logo a ti ao passar pelas nuvens. Tenho a convicção de que ainda és mais sedutora do que aquilo que imagino. Tens semblante de Giacomo Casanova e som perfumado de Vivaldi. Se no teu leito renascer, amar e morrer de amores, fico tua refém.Prisioneira afortunada serei.No domingo dir-te-ei: – Buona sera, Venetia.

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Se o coração fosse corajoso e bailarino

Queria ter um coração corajoso e bailarino. Corajoso, para pedir que dances comigo. Bailarino, para acompanhar o teu passo. Quero que comandes o nosso ” ballet “. Que escolhas um palco na montanha virado para o lago. Não me podias ter levado para a mais bela montanha. Mas o meu olhar só se fixa no verde das tuas feições e no azul como sempre te vi. Tapas-me o céu e a montanha. Teu corpo parece uma árvore centenária que ainda aguenta mais um século, sem esforço. Podias não ser tão belo. Assim não me deixas apanhar uma papoila e ver o pôr do sol. Suavemente colocas a mão nas minhas costas para iniciarmos a dança. Fiquei tonta como quem anda às voltas até cair. Sentes o meu corpo leve e solto. Danças como se voasses ao lado de uma andorinha. Se o meu coração fosse corajoso, dizia-te que precisava do teu amor. Se fosse bailarino, dançava em teu redor como se fosses um varão.

Mas o meu coração é desajeitado para o amor e para a dança. Por outro lado, é suficientemente forte para fazeres de mim a perdiz que caças à distância apenas com uma bala. Peço-te para parares o baile senão eu nunca mais pararia.

A água que escorre da nascente para o lago é límpida, fresca e cristalina. Sugeres que bebamos daquela água. Se o meu coração fosse bailarino trazia-te a água à boca. Se fosse corajoso roubava-te um beijo, honestly.

quequeasextafeira

                                                    Quero que dances comigo.

Relações entre pares., Sem categoria

Por um metro

Apenas um metro os separa. Passam por dois séculos e o metro mantém-se. A distância é que parece do tamanho da Muralha da China. O que os afasta é a individualidade de cada um e a desigualdade da relação.
Havia uma fronteira estreita que fazia lembrar a Faixa de Gaza. Paradoxalmente, existia: suavidade; honestidade; espontaneidade; seriedade; intimidade e uma cumplicidade perene. Como se estivessem numa ilha deserta.
Não são interrompidos por nada exceto pelo lapso de tempo que existe entre os dois. Ele é uma máquina que foca e filtra. Ela um dispositivo que às vezes fica sem megabytes. É necessária muita lucidez e coragem para passar pelo tempo sem sair do mesmo lugar.

Ele foca e filtra.
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Quero olhar para si

Indíca acorda antes do dia amanhecer. O céu de um cinzento muito escuro quase não deixa antever o dia. Explosões de gaivotas anunciam tempestade no mar. Sexta-feira de inverno… Procura-o, e ele pergunta :
– Que aconteceu ?
– Quero olhar para si…
Ele retira os óculos da ponta do nariz. A pinta que lhe davam os óculos, pensou para si. O brilho do seu olhar, enquanto o observava fez também o sol, lento, resplandecer. Disse :    -Estou a olhar para si.
-Recordo-me desse seu olhar – diz ele.
Produz-se uma mudança, subitamente, mais intensa. O homem permanece parado, mas inexplicavelmente, Indíca, de cada vez que o observava, ele parecia sempre diferente. Em cada (não) expressão o charme aumentava. Como os nove graus, do início da manhã, já passaram para treze. Não trocava o inverno pelo verão só para o poder olhar, mesmo que, pontualmente. De repente, ele move-se e diz-lhe:
-Vá, não deixe passar a sexta-feira.

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